Oswaldo Lenine Macedo Pimentel, conhecido por todos como Lenine é cantor, produtor musical e arranjador. Como ele se define: cantautor. Nasceu no dia 2 de fevereiro de 1959. Recifense-carioca, brasileiro do mundo, traz em suas composições influências de manifestações culturais de seu País e de inúmeros gêneros musicais, desconsiderando rótulos ou classificações.
Com mais de 30 anos de carreira, dez discos lançados, dois projetos especiais e inúmeras participações em álbuns de outros artistas, Lenine já teve suas canções gravadas por nomes como Elba Ramalho, Maria Bethânia, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Ney Matogrosso, O Rappa, Zélia Duncan, entre tantos outros. Produziu CDs de Maria Rita, Chico César, Pedro Luís e a Parede e do cantor e compositor cabo-verdiano Tcheka, além de trilhas sonoras para novelas, seriados, filmes, espetáculos de teatro e dança, como os do renomado Grupo Corpo.
Lenine ganhou cinco prêmios Grammy Latino, 2 APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), nove Prêmios da Música Brasileira e já se apresentou em dezenas de países em suas rotineiras turnês internacionais, que também o levaram a alguns dos maiores festivais de música do mundo, como o de Roskilde (Dinamarca), Womad, de Peter Gabriel (Inglaterra, Espanha e Ilhas Canárias), Festival de Montreal (Canadá) e Eurockéennes (França).
Em 2013, o cantor celebrou seus 30 anos de carreira. Na pauta, homenagens, documentários e 30 projetos especiais, como o reencontro com Marcos Suzano no show 20 anos de Olho de Peixe; a turnê europeia “The Bridge”, com a Martin Fondse Orchestra; um show especial celebrando os 30 anos do disco Baque Solto (em Recife); além da turnê Concertos Chão e dos shows Lenine Solo. O Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros foi um dos eventos escolhidos a dedo pelo artista para celebrar e fazer parte da turnê de 30 anos.
Entre março e julho de 2014, se lançou pelo Brasil em sua primeira “turnê socioambiental”, visitando e compartilhando sua música nas sedes de projetos sociais de referência em todas as regiões do País, entre os extremos do Acre ao Rio Grande do Sul. Esse trabalho foi contado no livro Encontros Socioambientais com Lenine: Música e Sustentabilidade numa só nota. O cantor ainda dividiu o palco com Rui Veloso e Angelique Kidjo, no Rock in Rio Lisboa, e com Maria Gadú, na turnê Cantautores, pela América do Sul. Foi também o ano que encerrou a turnê inspirada no disco Chão, que começou em 15 de março de 2012, em Pernambuco. A despedida foi em 15 de novembro de 2014, no Paraná, depois de percorrer 80 cidades diferentes no Brasil e em países como Alemanha, França, Itália, Holanda, Portugal, Argentina, Chile e Uruguai.
Ao mesmo tempo em que colocava as mãos no primeiro exemplar de seu mais recente disco de inéditas, Carbono, Lenine já botava os pés na estrada com a nova turnê. Gravado de janeiro a março de 2015 entre Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Amsterdam, o disco foi lançado em abril de 2015 pelo selo Casa 9, com distribuição da Universal Music. Carbono, embora pretexto, embora elemento, embora título, faz jus ao seu lugar na química, ciência estudada por Lenine na juventude. É liga pra tudo quanto é coisa, e suas conexões com outros átomos podem gerar uma infinidade de resultados. Do grafite ao diamante – e agora, canção. Como nos versos com o filho João: “solene, terreno, imenso; perene, pequeno, humano”.
Os passos seguintes se dão na Holanda, onde é feito o CD/DVD The bridge – Lenine & Martin Fondse Orchestra – Live at Bimhuis (2016), e no Rio de Janeiro, onde seu 13º disco de carreira traz no nome – Em trânsito (2018) – uma boa síntese do fazer artístico de Lenine: cantautor a caminho das próximas trovas, de novas reflexões e olhares sobre seu tempo. Caminhada de destino imprevisível, mas com pelo menos uma certeza: a de que nosso cantautor estará fazendo música livre, sem adjetivos, no exercício constante de se reinventar a cada novo trabalho.
LENINE NO ENCONTRO DE CULTURAS
De fala mansa e gingado próprio, Lenine começou o show apenas com voz e violão, marca da turnê intimista de comemoração. No repertório, o músico relembrou músicas do álbum Olho de Peixe e outros sucessos como Jack Soul Brasileiro, A rede, O homem dos olhos de raio x. "Música é igual filho. E como pai eu tendo a dar mais atenção para os mais novos”: foi assim que Lenine anunciou o repertório das músicas do álbum Chão. Para o público não importava se a música era antiga ou nova, a maioria sabia a letra e quem não sabia arriscava palavras soltas para poder fazer parte do show. Cerca de 5 mil pessoas estavam presentes.
Entre uma música e outra, Lenine interagia com o público e compartilhava o prazer de tocar no Encontro: “se depender de mim, isso vira tradição. Vocês vão ter que me aguentar todos os anos”. Outro prazer latente para o músico era poder tocar as músicas da forma como foram feitas, naquele jeito intimista, apenas voz e violão. No meio do show, Lenine fez um pedido a todos: “vamos aplaudir esse Encontro que tem como foco a diversidade”.
Lenine encantou e se encantou com a atmosfera do Encontro de Culturas. Em entrevista, ele fala um pouco da experiência de visitar pela primeira vez a Chapada dos Veadeiros e comemorar 30 anos de carreira no Encontro de Culturas.
EC – Quais estão sendo suas impressões da Chapada dos Veadeiros?
L - Pra quem vem a primeira vez, como é o meu caso, é muito impactante. É tudo muito bonito. Tem uma estranheza maravilhosa de ser um Cerrado de altitude, a fauna e a flora é muito específica, muito pontual. Eu sou curioso, né? Então eu estou apaixonado pelo lugar, quero vir mais vezes. O que formou um lugar como esse foi a entrega de um povo que encontro aqui. Não é do povo indígena que eu estou falando, estou falando do outro povo que encontrou esse lugar assim, sabe da perda do povo indígena, sabe como nós maltratamos a raça que os fazem. De alguma maneira assumindo essa culpa, eles fizeram desse lugar um lugar especial. Por ter esse lugar, esse passado histórico com o garimpo... Esse lugar ficou esquecido. Tanto é que tem quilombola que foi achado sem nunca ter tido contato com essa imensidão. Então isso dá uma real ideia da dimensão desse País.
EC – Você acha que pode surgir uma música desta experiência?
L - Para quem trabalha com música, como eu. Que é autor e compositor, como eu declaro, tudo é referência, eu sou meio esponja. Eu posso usar todas essas referências ou parte delas nos meus discursos, nas minhas palavras, nas minhas canções. Com certeza, de uma maneira ou de outra, uma experiência como esta determina tanta coisa que vai sair algo.
EC – Em uma entrevista, você disse que “para conhecer do Brasil é preciso ouvir muito”. Você considera que já conhece muito do Brasil?
L - Não. Eu tenho 54 anos, eu tenho uma parceira maravilhosa que é a música que me leva a todos os lugares possíveis e é a primeira vez que eu estou em São Jorge. Então, eu não conheço nada. Eu queria conhecer o Brasil, hoje eu quero conhecer Goiás. A gente vive num país com dimensão continental e eu tenho desejo de conhecer onde eu nasci, um povo tão misturado, que tem a ver com tantas culturas celebradas num Encontro como esse, que é justamente cultura popular.
Sabe a constatação que eu chego? É que a gente nem arranhou a profundidade do que seja o Brasil. Até 10 ou 12 anos atrás, o brasileiro médio nem sabia o que era o Boi de Parintins. Descobriu agora. Então, é impossível acreditar que o brasileiro médio saiba o que é uma Viola-de-Cocho. Mas logo logo ele vai, porque querendo ou não, ele vai se deparar com cada expressão que forma esse imenso Brasil. Eu acho que é um tempo de maturação. Até porque tem pessoas como a gente que estão aí propagando. Existem festivais e encontros como este que celebram justamente essa diversidade, esta cara multifacetada, esse Brasil.
EC - Como você desenvolveu esse jeito de tocar violão tão peculiar?
L - Eu não procurei esse violão, ele caiu no meu colo. E ele caiu, porque o ato de compor e tocar é muito solitário, muito sozinho. Como eu sou da geração do rock’n’roll, com Zeppelin na cabeça, com o violão eu não conseguia chegar nem perto daquilo. O que eu fazia? Ia atrás das sujeiras que eu podia tirar do violão para transformar o som em algo mais pesado. De tanto fazer isso solitariamente, eu descobri uma maneira de tocar que tinha ali embutido um pouco da bateria, um pouco do baixo, um pouco da guitarra, um pouco do rock que eu ousava achar que fazia. E meus amigos começaram a falar “rapaz, esse violão é tu”, “esse violão é todo Lenine”. Meus amigos mais próximos perceberam, mas não foi uma procura. E sim, hoje eu sou reconhecido por isso. Eu me orgulho muito disso. Ainda mais porque a linha evolutiva do violão brasileiro passa desde Baden Powell a Hermano Reis, Djavan, Gilberto Gil, João Bosco, João Gilberto... Só casca grossa. Então, estar nesse nicho e ter como expressão o violão, como quase uma extensão do seu corpo... Eu me sinto muito orgulhoso disso.
EC - Como está sendo a turnê de comemoração dos 30 anos?
L - Trocando o chip toda hora. Cada hora a gente comemora de um jeito diferente. O Suzano e eu nos encontramos e apresentamos o Olho de Peixe. Fiz show com a orquestra do maestro holandês Martin Fondse... Estou aproveitando de toda forma. E hoje, por exemplo, é um dia muito especial, que me possibilita exercitar uma coisa que é raro para mim, que é mostrar a canção como foi feita: desnuda.
EC - Privilégio nosso...
L - Privilégio meu também. É uma coisa bacana, porque tem a ver com o exercício solitário de compor que eu falei. Tudo parte do violão e da voz, do solitário ali.
EC – Como surgiu a escolha do Encontro de Culturas para sediar um dos shows de celebração dos 30 anos? O que isso representa para você?
L - Pra ser bem honesto, nós chegamos a conclusão de que tinha que ter 30 velinhas para comemorar de 30 maneiras diferentes esses 30 anos. Então, tudo corroborava, isso é diferente, isso a gente pode celebrar. Um show num encontro de culturas na Chapada dos Veadeiros, com a lua cheia de São Jorge me recebendo, dizendo “canta aí, canta direito”.