Pereira da Viola
Cultura tradicional

Pereira da Viola

Pereira da Viola, José Rodrigues Pereira, encanta todos por onde se apresenta. Desde o início da carreira artística, passando pela descoberta da viola, mostra que é um artista que traz consigo o prazer e o compromisso de cantar as coisas de sua gente. Seu talento e estilo único fizeram com que fosse alçado a ícone da viola caipira, não apenas pela crítica e mídia, como também pelo público que se encanta por seu virtuosismo e carisma.

Cresceu em um ambiente humilde, mas de grande riqueza cultural, influenciado pela cultura afro-indígena e pelos sons das folias. Seu pai, João Preto, era sanfoneiro, e sua mãe, Augusta, líder e puxadora de cantos nas festas do reisado. Aos 11 anos, José tornou-se autodidata em violão. Com 14, começou a se apresentar em shows de calouros, sendo premiado em todos.


Em 1982, influenciado pelas obras de artistas como Dércio Marques, Rubinho do Vale, Titane e Milton Nascimento, passou a compor músicas que retratavam sua história. Em 1986, foi apresentado à viola e se encantou pelo instrumento. Junto com sua primeira viola, ganhou de um amigo o apelido, Pereira da Viola, uma homenagem ao músico Paulinho da Viola. A brincadeira acabou lhe rendendo seu nome artístico.

Foi com o folião Valdão que Pereira aprendeu a tocar a viola, utilizando, simultaneamente, o tampo para percussão, o que deu origem às suas famosas batidas de contra-dança, batuques e voltados-inteiro. Este momento marca o encontro definitivo do trabalho do artista com suas origens. A busca pelas raízes do povo brasileiro e seu envolvimento com os povos indígenas o leva a se apresentar no Acre, Amazonas, Mato Grosso e São Paulo.


É na capital paulista que Inezita Barroso conheceu o trabalho de Pereira e, imediatamente, o convidou a dar uma entrevista no programa Mutirão, na Rádio USP-SP. Logo em seguida, os dois já dividiam um show no Teatro Popular do Sesi (SP).

Em 1993, Pereira gravou de forma independente seu primeiro disco, Terra Boa, considerado pela crítica como uma obra prima da música regional brasileira. Em 1996, em parceria com a Lapa Discos, gravou seu segundo CD, Tawaraná – nome de uma dança indígena do Xingu –, disco que lhe rendeu a indicação ao Prêmio Sharp da Música.

Em 1998, participou do projeto Violeiros do Brasil, que reuniu 12 violeiros de várias regiões do país, no Sesc Pompéia, em São Paulo. O encontro resultou num CD homônimo, gravado pelo selo “Núcleo Contemporâneo”, e em um especial da TV Cultura.


Ainda em 1998, gravou seu terceiro disco solo, Viola Cósmica (Lapa Discos). O disco contou com a participação de quatro grandes violeiros: Paulo Freire, Brás da Viola, Ivan Vilela e Roberto Corrêa, além do rabequeiro Fiaminghi e da cantora Titane. O CD tem também a participação especial de sua mãe, Mãe Augusta.

Em 2001, Pereira da Viola lançou de forma independente o quarto disco de sua carreira, Viola Ética. Produzido e dirigido pelo próprio artista, o CD contou com participação especial de Inezita Barroso, Paulo Freire e Brás da Viola.

Em 2003, promoveu o Encontro Nacional de Violeiros, em Ribeirão Preto. O evento recebeu 10 mil pessoas e resultou na criação da  Associação Nacional dos Violeiros, entidade que busca resgatar a cultura sertaneja e luta por melhores condições de trabalho para a categoria. 

Ainda em 2003, Pereira entrou para o escritório de projetos e produções culturais, Cria! Cultura. Em 2004, passou a fazer também parte do selo musical mineiro “+ Brasil Música”, relançando, nesse mesmo ano, os discos Terra Boa e Viola Ética. Em 2005, partiu para um turnê pela Venezuela, onde representou o Brasil no Festival da Canção Necessária, onde foi agraciado pelo público e pela mídia venezuelana. 


Em 2006, lançou o seu quinto álbum, batizado Akpalô, que, em nagô, significa “contador de histórias, aquele que guarda e transmite a memória do seu povo”. O nome retrata com maestria a influência da cultura do Vale do Mucuri na trajetória e no trabalho do artista, bem como sua importância como porta-voz da região.

Considerado por Pereira como um divisor de águas em sua carreira, o álbum mantém os vínculos poéticos, ideológicos e de sonoridades afro-indígenas com os trabalhos anteriores, mas aponta novos caminhos ao propor uma interlocução com outros estilos, como a música clássica, o blues e a MPB. O CD conta com direção e arranjo de André Siqueira e com as participações especiais de Tambolelê, Titane, Celso Moretti, Rubinho do Vale, Gabriel Guedes, Dércio Marques e Lígia Jacques.

“A gente inchou o disco”, disse o produtor artístico e arranjador do álbum, André Siqueira, destacando os sopros, o quarteto de cordas, o baixo, a guitarra e a bateria, que se juntam à viola neste quinto título de Pereira. Na época do lançamento, Pereira afirmou: “Não quero romper com nenhum universo, mas também não quero ser refém de nenhum. Não vim aqui para ficar repetindo ninguém, nem a mim mesmo”. 

ORIGEM

"Entre 85 e 86, a viola passou a fazer parte da minha vida. Eu sentei no jardim do centro da cidade de Serra dos Aimorés, que é pequenininha. O jardim é gostoso, tinha um banquinho, e eu sentei com a viola. Quando percebi estava tocando Tristeza de Jeca. Foi a primeira música que toquei na viola." 
Pereira da Viola

No dia 16 de agosto de 1962, nasceu em São Julião, pequena comunidade rural do Vale do Murici, norte de Minas Gerais, José Rodrigues Pereira, o Pereira da Viola. Décimo primeiro dos treze filhos de João Preto (José Rodrigues Pereira) e Mãe Augusta (Augusta dos Santos Pereira), Pereira era conhecido em sua família pelo apelido de Zezinho ou Zé Nosso (pois tinha muitos “Josés” na região).


Em sua infância era um menino tímido e, segundo a mãe, chorão. O ambiente em que cresceu era humilde, mas de grande riqueza cultural. “Depois do trabalho na roça, meu pai pegava a sanfoninha de bode, que é a sanfona de oito baixo, e começava a tocar, minha mãe a cantar e a gente a dançar”.

A forte tradução cultural da Região do Vale do Murici também foi determinante na formação de Pereira. Ainda criança, acordava à noite ao som das folias, que visitavam sua casa trazendo violas, sanfonas, tambores e muita cantoria. 

ENCONTRO DE CULTURAS


Pereira da Viola participou do Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros em 2006, 2008, 2009, 2011 e 2012. Em 2008, nossa 8ª edição, sentou com a gente e contou um pouco sobre sua trajetória, na entrevista a seguir. 
Uma "incelente maravilha", conhecida saudação do artista.  

De onde surgiu a paixão pela viola?
Foi uma maneira que encontrei de estar em contato com a minha própria identidade. Saí de casa muito cedo para estudar no Espírito Santo. Na década de 1980, fui estudar em Serra dos Aimorés (MG), onde acabei me envolvendo com o movimento cultural. Foi lá também que entrei em contato com a música de Elomar, Rubinho do Vale, Dércio Marques, Doroty Marques, Paulinho Pedra Azul e vários outros artistas que me influenciaram. Logo depois, senti uma necessidade de retornar à minha base cultural, que é minha própria família. Todo mundo em casa toca e canta.  

Existe alguma influência especial?
Voltei para casa com gravador na mão, anotando tudo, estudando as pessoas da comunidade, em especial minha mãe, a base para minha formação de vida pessoal e musical. A Mãe Augusta canta e dança batuque até hoje. Temos uma Folia de Reis que participo todos os anos.  

Como você define seu estilo?
Sou autodidata e isso é importante porque o artista acaba criando uma identidade própria. Mas o estudo é muito necessário, sou favorável à volta do ensino da música nas escolas. Vivencio todos os ritmos: indianos, clássicos, eruditos, latinos e o blues, que é, para mim, a "folia norte-americana".

Você é um artista popular que tem sua origem ligada à cultura tradicional. Existe alguma dificuldade em traduzi-la para o palco?
Fazemos batuque, cantigas de roda, contradanças e tentamos trazer a alma destas manifestações. Algumas coisas são difíceis, mas eu sou um artista de palco. Ainda é necessário um bom estudo para levar a cultura tradicional ao palco e manter as características que têm. À medida que vão se apresentando, os próprios artistas adaptam suas artes. As produções também devem criar espaços favoráveis, com outra lógica, onde não haja a diferença tão grande entre o natural e o espetáculo.  


Como você vê o desinteresse da mídia em relação à cultura popular?
Não é a visibilidade da mídia que faz a cultura popular sobreviver. É sua própria força que a faz se manter viva de geração em geração. É igual à própria terra, podem até matá-la, mas ela vai sobreviver de outra maneira. Agora percebemos um novo olhar dos gestores públicos para a cultura popular.  

Você leva aos seus shows o lado lúdico da música, incluindo as brincadeiras de roda, e o público adora. Fale um pouco desta ideia. 
É importante ter acesso à informação. Parte das coisas que levo para o palco vem de um movimento de pessoas ligadas à arte e que têm a brincadeira como forma de expressão, assim como Antonio Nóbrega, Adelsinho, Lydia Ortelio e outros espalhados pelo Brasil. Trago para o palco a brincadeira da vida. Brincar é uma coisa séria. O mundo está muito carrancudo e isso não está levando o ser humano a lugar nenhum. O futuro do homem está condenado com a forma de desenvolvimento que está sendo implementada. Temos que levar a vida com menos seriedade, mais leveza. Não é fácil, mas é um exercício cotidiano. Temos que ser moleques, no bom sentido.  

ENCONTRO DE 2005
*texto de Giovanna Drago

A vida do mineiro Pereira da Viola, natural de São Julião, parece ser de pura música e tradição. Ele começa o show com uma cantiga que, segundo ele, “tem mais de trezentos anos e diz assim”:

“Dona Mariana oi léo leó léo
Lava roupa com sol ali
Com uma trouxa dum tamanho assim
Com um bolin de sabão assim
E uma tabinha de tamanho assim”

A ligação com a música é tão forte que Pereira da Viola acredita ter sido gerado em época de folia ou de qualquer outro batuque. Para ele, a música é a oportunidade de transmitir o que há de mais puro da sua essência e do seu universo.

No palco, Pereira marca presença com muita simpatia, aproveitando para contar histórias de sua infância enquanto muda a afinação da viola.

Pereira não perde nenhuma oportunidade para mexer com o imaginário do público e caipiriza clássicos mundiais como o Bolero de Ravel, trechos da ópera de Carmem e o Hino Nacional Brasileiro. Para ele, é fundamental que o Brasil reconheça que tem o saci, pois isso é mais importante que o Halloween, e considera que o mais especial na cultura brasileira é a Folia, um universo repleto de criatividade e de fé.

Pereira da Viola diz que o Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros é tudo aquilo que ele acredita sobre a Cultura Brasileira, pois reflete bem o sentimento de ser brasileiro.

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